O Brasil garante acesso universal e regular aos ARVs necessários para o controle da infecção pelo HIV no SUS desde 1996. Aspectos relacionados a preços e gastos crescentes com medicamentos em situação de monopólio têm ameaçado a sustentabilidade financeira da resposta à epidemia, especialmente após a entrada em vigor do Acordo TRIPS da Organização Mundial do Comércio que requereu o patenteamento de medicamentos. O objetivo da pesquisa foi identificar e analisar os principais fatores que influenciaram as estratégias de governo adotadas para a produção local de medicamentos ARVs em situação de monopólio fornecidos pelo SUS no período de 1992 a 2012, utilizando abordagens do campo da análise de políticas. Primeiro, o levantamento e análise de legislação relacionadas à produção local de medicamentos e políticas de saúde, desde o início do século XX até 1991, ilustram a adoção de instrumentos como lista de produtos prioritários de doenças prevalentes; produção de princípio ativo; diagnóstico das necessidades dos laboratórios públicos; definição de preços tetos; exclusão da proteção patentária para produtos e processos farmacêuticos, assim como a atuação do Ministério da Saúde na coordenação da política industrial. Segundo, a análise do período de 1992 a 2012 mostrou que os instrumentos de política industrial implementados principalmente a partir de 2008 guardam semelhança àqueles adotados anteriormente no país. A principal diferença refere-se à existência de um mercado público marcado também por produtos em situação de monopólio e pelo alto custo e gasto para o SUS. A questão da produção pública, ainda que em intensidades variadas, esteve sempre presente na agenda federal de saúde durante o período estudado. O acesso a ARVs e da produção pública como resposta inicial, a partir da década de 1990, resultou de uma articulação de sujeitos governamentais, neste caso o Pnaids e Farmanguinhos/Fiocruz. Os estudos de caso seguiram modalidades de enfrentamento da barreira patentária: efavirenz (licença compulsória), tenofovir (subsídio ao exame) e atazanavir (licença voluntária). O uso da licença compulsória do efavirenz em 2007 aponta um aspecto de continuidade, por parte do Pnaids, enquanto empreendedor de políticas em defesa das salvaguardas do Acordo TRIPS, e ao mesmo tempo de singularidade, devido ao alinhamento de sujeitos capazes de levar a solução para o nível mais alto nível da tomada de decisão pela importação e produção local, especialmente num contexto de implementação da política industrial. A produção local do tenofovir se inseriu na política do Complexo Industrial da Saúde, tendo a garantia de exclusividade do mercado público como principal incentivo. O caso do atazanavir reflete um cenário de restrição de alternativa oportuna de medicamentos genéricos no mercado internacional. Estimativas de redução de preço sugerem redução significativa para o efavirenz, porém para o tenofovir e o atazanavir observou-se que as reduções refletem principalmente perdas inflacionárias ao longo dos anos. Iniciativas para estimular a produção local de medicamentos devem contribuir para aumentar o poder de barganha do Ministério da Saúde na negociação de preços de medicamentos em situação de monopólio. A estratégia da garantia de exclusividade do mercado público a produtos que configuram alto gasto para o SUS deve ser avaliada para que não interfira negativamente em outras estratégias que buscam, no curto prazo, alcançar reduções de preços e contribuir para a sustentabilidade de políticas de acesso a medicamentos.