A resolução espontânea precoce de lesão em leishmaniose tegumentar americana é ainda pouco compreendida e pode se relacionar à espécie de Leishmania e às características da resposta imune do hospedeiro. Objetivou-se comparar dados clínicolaboratoriais e perfil de resposta imune in situ entre pacientes que necessitaram de tratamento específico (LC) e aqueles que evoluíram para resolução espontânea, sem necessidade de tratamento (LRE). Foram estudados 13 (2,9%) casos LRE e 432 pacientes LC. Compararam-se dados clínicos e laboratoriais durante a investigação diagnóstica. Posteriormente, 12 pacientes LRE com fragmentos histológicos criopreservados foram pareados (por sexo, idade e localização de lesão) com 24 pacientes LC, para estudo imunohistoquímico. O grupo LRE apresentou mais: lesão única (p=0,027); aspecto cicatricial ao exame inicial (p=0,001); lesão localizada em tronco posterior (p=0,017) e cicatrização mais precoce (p<0,001). No grupo LC, predominou: lesões ulceradas (p=0,002); amastigotas no exame histopatológico (p=0,005); e positividade na cultura (p=0,001). Observou-se a maior positividade nos exames parasitológicos no grupo LC. Em 58,8% dos pacientes deste grupo houve positividade em três ou mais testes, enquanto que no grupo LRE todos os casos foram positivos em apenas um destes, principalmente na PCR (p=0,030). No estudo in situ o grupo LC apresentou maior percentual de linfócitos CD22, macrófagos, células NK, marcadores inflamatórios relacionados à ativação/proliferação celular e citocinas de regulação. Já os pacientes LRE tiveram maior percentual de linfócitos CD8, CD62E e de IFN-γ, bem como presença de neutrophil extracellular traps (NETs). Esses resultados indicam uma menor carga parasitária no grupo LRE, evidenciada pela dificuldade de confirmação diagnóstica por exames parasitológicos. O processo inflamatório foi mais exacerbado nos pacientes LC. O equilíbrio entre produção de citocinas de regulação, baixa carga parasitária, ativação macrofágica eficiente e ativação endotelial poderia contribuir para a resolução espontânea precoce. Nossos resultados sugerem uma menor carga parasitária nos casos LRE, evidenciada pela dificuldade de confirmação diagnóstica por exames parasitológicos, o que poderia facilitar o controle da infecção. A literatura aponta a ausência/deficiência de tratamento específico como fator predisponente para o desenvolvimento de recidivas cutâneas e/ou metástases na LTA. No entanto, devido à potencial toxicidade dos fármacos indicados para seu tratamento, é possível discutir a validade de se instituir terapia medicamentosa na LTA com evolução para a cura espontânea precoce. O grupo LRE aqui estudado foi acompanhado por até 5 anos após a cura clínica, e em nenhum dos casos houve evidência de recrudescimento da infecção, sugerindo, portanto, que não se justifica instituir tratamento para estes pacientes. Entretanto, acompanhamento clínico e otorrinolaringológico periódico é aconselhável para detectar uma possível recorrência.